Saturday, September 16, 2006

Vida e Matança

Sir Arnold Wesker, dramaturgo inglês, acaba de publicar, pela Simon & Schuster, seu primeiro livro, Honey.
Fez, por esses dias, uma carta aberta ao primeiro-ministro Tony Blair, a propósito do terrorisrmo islamita.

É bastante apropriada. Traduzi-a, abaixo.

Caro Primeiro Ministro, escrevo-lhe no quinto aniversário do 11/9.

Porque acredito que o senhor é um importante estadista mundial, e que sua decisão de revelar a data de seu afastamento do cargo à sua própria conveniência foi a correta, posso presumir sugerir que agora é o tempo de fazer um grande discurso dirigido especialmente a Osama bin Laden.

Nenhum estadista mundial tentou desafiar esta aberração da humanidade para o debate. Ouvimos apenas adjetivos triviais como "não civilizado", "assassino", "fanático irracional" e, recentemente "islamofascista"; porém ninguém pensou ainda em sugerir a bin Laden, em linguagem simples, que o islã poderia estar sofrendo de um profundo complexo de inferioridade. A ameaça que nos confronta a todos, Oriente e Ocidente, é uma crença infantil e irracional de que este complexo de inferioridade só pode ser mitigado se a supremacia do islã for imposta ao mundo, não importa que grandes partes dele tenham que ser destruídas no processo.

Quando acordamos na manhã, os primeiros pensamentos da maioria das pessoas (falando com licença poética) têm a ver com a melhora da vida; quando bin Laden acorda, seus primeiros pensamentos têm a ver com matança; nosso instinto é para o que pode ser construído, seu instinto é para o que pode ser destruído.

Esses contrastes precisam ser marcados ao rubro na consciência do mundo. O conflito não é entre civilizações ou culturas, mas entre construtores e destruidores.

Não acredito que as torres gêmeas foram visadas porque eram símbolos do capitalismo, mas porque elas se projetavam ao céu como símbolos do gênio e do sucesso. Não é o Ocidente corrupto que bin Laden odeia, é o Ocidente colorido que ele odeia, a cor como uma imagem da alegria, da energia e da criatividade. Há algo acerca da felicidade das outras pessoas e de seu sentido de espírito livre que irracionalmente faz levantar a ira de certas mentalidades, seja no pátio da escola, seja na arena religiosa/política.

(Aqui eu, Fridericus, me intrometo no meio da carta de Sir Arnold a Tony Blair para dizer que não posso ser demasiado enfático em minha concordância ao que foi exposto: já acredito nisso, isto é, que as coisas se passem como Sir Arnold delineou, há muitos anos.)

A carta continua, a seguir.

Pode ser pensado que essa ameaça vem apenas de uns poucos fanáticos marginais; mas embora eles sejam os ativistas, temo que existam vastas fileiras de apoio a eles - daí as perturbadoras revelações de que há potencialmente milhares que poderiam, a partir de um sentimento de inadequação, estar envolvidos no terrorismo no Reino Unido. Portanto, eu não acredito que o debate deva ser sobre política, mas sim mais sobre psiquiatria.

Um dos mais assertivos muçulmanos que apareceram nestes tempos foi Wafa Sultan, a psiquiatra síria-americana de Los Angeles (veja seu perfil na edição do New York Times de 11 de março de 2006). Talvez ela já tenha sido trazida à sua atenção. Ela foi entrevistada pela al-Jazeera e vista por milhões, desde quando tem sido aplaudida por muçulmanos progressistas e ameaçada de morte pelos reacionários. Mas ela feriu a nota certa ao afirmar que os muçulmanos do mundo, que compara desfavoravelmente aos judeus, mergulharam em um vórtex de autopiedade e violência; e que o mundo não testemunhava "um choque de religiões ou culturas, mas uma batalha entre a modernidade e o barbarismo".

Falando do Holocausto, ela disse: "Os judeus saíram daquela tragédia e forçaram o mundo a respeitá-los, com o seu conhecimento, não com o seu terror; com seu trabalho, não com seu choro e grito... Não vimos judeu algum se explodir em um restaurante alemão. Não vimos qualquer judeu protestar por meio da matança de pessoas... Apenas os muçulmanos defendem suas crenças queimando igrejas, matando pessoas e destruindo embaixadas. Este caminho não levará a qualquer resultado. Os muçulmanos devem perguntar a si mesmos o que eles podem fazer pela humanidade, antes de exigir que a humanidade os respeite."

E no mês passado Ahmed Zewail, que ganhou o prêmio Nobel de química em 1999, declarou: "Deveríamos ter confiança em nós mesmos e na participação global, e não culpar os outros pelas calamidades atuais ou usar a religião para ganhos políticos. A responsabilidade do indivíduo por si mesmo e pela melhora da sociedade está claramente declarada no Corão: "Com efeito! Deus não mudará a boa condição do povo enquanto ele mesmo não modificar seu estado de bondade"."
Ambos estes muçulmanos altamente inteligentes também falam acerca do conflito entre a construção e a destruição.

Perdoe-me o comprimento desta carta, mas "construção ou destruição" me parece um importante tema para nosso tempos. Como o poeta W. H. Auden escreveu: "Nada é agora tão horrível ou tolo que não possa acontecer."




0 Comments:

Post a Comment

<< Home